Prevenção e tratamento
Infográfico

Incidência
A incidência de aspiração pulmonar de conteúdo gástrico no período perioperatório tem diminuído ao longo das décadas, contudo continua sendo associada à severa morbidade e óbito, a despeito dos recentes avanços relacionados às diretrizes de jejum pré-operatório, algoritmos de manejo da via aérea difícil, melhorias nos equipamentos de via aérea e treinamento multiprofissional.
Em um estudo realizado no Projeto Closed Claims publicado no Anesthesiology, com compilado de manifestações por má prática anestésica no período de 2010 a 2014, dos 115 casos de aspiração pulmonar perioperatória, houve relato de dano permanente em 14 % e morte em 57% dos casos. Neste mesmo estudo, foi verificado que 61% dos pacientes tinham obstrução gastrointestinal ou outra doença intra-abdominal.
Fatores de risco
Risco de broncoaspiração relacionado aos procedimentos:
- Cirurgias de emergência
- Procedimentos para trauma
- Cirurgias para abdome agudo, principalmente obstrutivo
- Cirurgias em posição de Trendelenburg
Risco de broncoaspiração relacionado aos pacientes:
- Estômago “cheio”:
- Jejum inadequado (< 8hs para alimentos gordurosos; <6hs para alimentos leves, sem gordura;< 2hs para líquidos sem resíduos).
- Obstrução Gastrointestinal
- Atraso no esvaziamento gástrico
- Diabetes mellitus (DM)
- Insuficiência Renal Crônica (IRC)
- Trauma recente
- Gravidez em trabalho de parto
- Cirurgia GI prévia
- Incompetência do Esfíncter esofágico inferior
- Hérnia de hiato
- Doença do Refluxo Gastroesofágico (DRGE)
- Gravidez
- Cirurgia do TGI superior
- Incompetência do Esfíncter esofágico superior
- Administração recente de opioides
- Obesidade (IMC≥35)
- Aumento da Pressão Abdominal
- Ascite, massas abdominais
- Obesidade (IMC≥35)
Pacientes com história de doença neurológica (AVC, rebaixamento do nível de consciência, doença de Parkinson) também são propensos à broncoaspiração.
Risco de broncoaspiração em relação aos cuidados clínicos:
- Ausência de sonda nasogástrica (SNG)
- Uso de máscara laríngea ou máscara facial em pacientes de alto risco
- Sedação excessiva durante anestesia regional ou antes da anestesia geral
- Dificuldade para intubação
- Extubação precoce
- Manejo inadequado após evento
Outros fatores de risco identificados frequentemente foram: DRGE, DM e Obesidade (IMC≥35).
Quanto aos cuidados clínicos, verificou-se uma maior incidência de broncoaspiração durante a indução da anestesia geral (48%), sendo mais comum antes mesmo da abordagem da via aérea.
Avaliação pré-operatória:
- Estar atento à identificação dos pacientes com alto risco para broncoaspiração e documentar em prontuário, para que esta informação possa ser compartilhada com todos que estarão envolvidos no cuidado.
- Realizar intervenções para diminuir o conteúdo gástrico (Medicação pró cinética, antagonista H2, inibidores da bomba de próton)
No caso de dúvidas quanto ao volume gástrico, pode-se realizar exames de imagem (USG) para avaliação do conteúdo.
Condutas para prevenção
Para a indução da anestesia:
- Garantir que todos os equipamentos estão checados e funcionantes, incluindo aparelho de ventilação, monitores, aspiradores (com sondas de aspiração conectadas)
- Verificar laringoscópios e solicitar material de via aérea difícil
- Solicitar ajuda para indução anestésica
- Realizar indução sequência rápida com aplicação da pressão cricoide adequadamente, liberando apenas após insuflação do cuff (conduta questionada recentemente, mas que ainda recomendamos)
- Intubação com videolaringoscópio com paciente preferencialmente em proclive
- Realizar extubação após reflexos presentes, com paciente em proclive ou decúbito lateral (Garanta que neste momento tenha disponível aspirador e materiais de VA para uma possível reintubação)
No caso de evidência ou suspeita de broncoaspiração, o manejo deverá ser direcionado ao tratamento de suporte.
Aspiração da traqueia antes de instaurar a ventilação positiva para prevenir deslocamento do conteúdo gástrico e realizar precocemente exame de imagem e broncoscopia para prevenir atelectasia distal.
Broncoaspiração pode levar a diversas condições clínicas, incluindo pneumonite química, pneumonia bacteriana, ou SDRA. Ventilação mecânica pode ser requerida por longos períodos.
A principal controvérsia está relacionada ao tratamento envolvendo antibióticos e esteroides. Os antibióticos devem ser utilizados somente nos casos de pneumonia confirmada, pois estes podem induzir ao desenvolvimento de bactérias multirresistentes. Não há evidência de que o uso de esteroides pode reduzir a mortalidade ou melhorar o desfecho.

Referências bibliográficas
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