Para realizar a descurarização, atualmente, contamos com duas drogas básicas disponíveis nos nossos hospitais, a neostigmina e o sugamadex. A neostigmina é um anticolinesterásico, ou seja, inibe a enzima acetilcolinesterase que metaboliza a acetilcolina da fenda sináptica entre o nervo e a placa motora. Com a inibição, a acetilcolina não é metabolizada e fica disponível em maior quantidade para competir com o BNM, deslocando-o do receptor nicotínico e retomando a função de contração muscular. Outras drogas dessa classe podem ser utilizadas, como a fisostigmina, piridostigmina e edrofônio, porém não são comuns no nosso meio.
Pela característica de ação dos anticolinesterásicos, eles podem ser utilizados para descurarizar o bloqueio promovido por qualquer bloqueador neuromuscular disponível. Alguns cuidados, porém, devem ser tomados. Como a acetilcolina aumenta não apenas na junção neuromuscular, mas em diversos locais do corpo todo, é importante que evitemos uma síndrome colinérgica no paciente. Para isso, deve ser administrado antes do anticolinesterásico um antagonista colinérgico muscarínico, como a atropina, na dose de 20 mcg/kg. Isso evitará efeitos como bradicardia ou sialorreia intensos. Além disso, é importante que só seja utilizado em paciente com pelo menos 2 respostas ao TOF.
A utilização de neostigmina em bloqueio profundo ou intenso pode aumentar o bloqueio de maneira paradoxal. O mesmo pode ocorrer com TOF > 70%, quando deve ser evitado o uso de anticolinesterásico. Caso não tenha um aparelho para monitorizar a intensidade do bloqueio, aqui poderá ser necessário utilizar sinais clínicos de alguma resposta muscular para considerarmos que não estamos com um bloqueio profundo ou intenso, como a movimentação do diafragma, que pode ser notada no ventilador mecânico ou na capnografia. Havendo essa resposta muscular, é um indício de que temos algum nível de motricidade e podemos iniciar a descurarização.
TOF | Dose de neostigmina |
Zero ou 1 resposta | Não utilizar neostigmina, aguardar pelo menos 2 respostas ao TOF |
2-3 respostas | 70 mcg/kg |
> 40% | 40-50 mcg/kg |
> 40% e < 70% | 20 mcg/kg |
> 70% | Evitar utilizar anticolinesterásico; aguardar aumento do TOF |
O sugamadex é uma droga mais morderna, da classe das ciclodextrinas, que se liga de maneira irreversível às moléculas do rocurônio ou vecurônio, inativando-as. A velocidade da reversão do bloqueio costuma ser maior do que com o uso de anticolinesterásicos, e podendo ser utilizado em qualquer intensidade de bloqueio. Como desvantagem, só pode ser utilizada para descurarização de rocurônio e vecurônio, além de apresentar custo mais elevado do que dos anticolinesterásicos, o que permite utilizar de maneira racional junto com a monitorização neuromuscular, administrando uma ampola de cada vez.
Importante destacar que para a reversão do bloqueio neuromuscular com sugamadex também é necessária a presença de ao menos duas respostas ao TOF para o uso de 2 mg/kg. Caso não tenha respostas ao TOF será necessária a avaliação de contagem pós tetânica: caso tenham 1-2 PTC a dose de sugamadex recomendada é de 4 mg/kg. Se não tiver PTC a dose para reversão é de 16 mg/kg.
Intensidade do bloqueio | Dose de sugamadex |
Moderado | 2 mg/kg |
Profundo | 4 mg/kg |
Intenso | 16 mg/kg |