Oxigenação: revisando alguns conceitos Copy

A oxigenação pulmonar é o processo pelo qual o oxigênio do ar inspirado é transferido dos alvéolos pulmonares para o sangue e o dióxido de carbono é transferido do sangue para os alvéolos para ser exalado. Durante a anestesia geral precisamos utilizar o suporte ventilatória para manter este processo de oxigenação adequado.

Conforme já vimos na sessão anterior a criança possui uma grande dependência da oxigenação pois possui uma alta taxa metabólica quando comparada ao adulto., necessitando proporcionalmente de mais oxigênio por kg de peso corporal, e assim caso tenha um comprometimento da oxigenação sanguínea associada a esta alta taxa metabólica irá rapidamente evoluir para hipoxemia.

Devemos nos lembrar de algumas peculiaridades da oxigenação em recém nascidos. Eles ainda possuem hemoglobina fetal (HbF), que tem uma afinidade maior por oxigênio que a hemoglobina adulta (HbA). Isso é um mecanismo fisiológico que facilita a transferência de oxigênio da mãe para o feto durante a gestação, mas também significa que o padrão de oxigenação muda após o nascimento, à medida que a HbF é gradualmente substituída por HbA.

A sensibilidade e a resposta das crianças à hipóxia e à hipercapnia difere significativamente da dos adultos por uma série de diferenças anatômicas e fisiológicas. Vamos relembrar?

Respostas Cardiovasculares e Respiratórias:

  • Crianças: Têm uma resposta rápida à hipóxia. Isso se deve, em parte, à alta taxa metabólica e à demanda de oxigênio. Recém-nascidos e lactentes podem apresentar bradicardia como resposta inicial à hipóxia.
  • Adultos: Tendem a ter uma resposta mais gradual. O mecanismo compensatório inclui o surgimento de taquicardia e aumento da ventilação.
Consumo de oxigênioCapacidade residual funcional
5 kg9 ml/kg x min10 ml/kg
10 kg7 ml/kg x min15 ml/kg
20 kg6 ml/kg x min30 ml/kg
adultos3,5 ml/kg x min

Se formos comparar adultos e crianças, uma criança pode evoluir para hipóxia 10 a 20 segundos após apneia pois ela possui menos reserva de oxigênio e maior consumo de oxigênio

Sistema Nervoso Central:

  • Crianças: O sistema nervoso central ainda está em desenvolvimento, o que pode resultar em respostas respiratórias menos eficientes. Recém-nascidos, especialmente prematuros, são mais propensos a apnéias em resposta à hipóxia. Esta população é de maior risco para apnéia pós anestésica também até atingir 60 semanas de idade pós conceptual.
  • Adultos: Têm uma resposta mais estável e progressiva à hipóxia, como tem um sistema nervoso central completamente desenvolvido é capaz de regular melhor a respiração e tentar ativar mecanismos de compensação inicialmente.

Sensibilidade à hipercapnia:

  1. Controle Quimiorreceptor:
    • Crianças: O controle quimiorreceptor (receptores que detectam alterações nos níveis de dióxido de carbono e pH) pode ser menos eficaz em recém-nascidos e lactentes. Eles podem ter uma resposta ventilatória menos robusta à hipercapnia.
    • Adultos: Geralmente, têm uma resposta ventilatória mais eficiente à hipercapnia, aumentando a ventilação para aumentar a eliminação do excesso de dióxido de carbono.
  2. Capacidade de Compensação:
    • Crianças: A capacidade de compensação respiratória em resposta à hipercapnia é limitada devido à menor força dos músculos respiratórios e à menor capacidade residual funcional.
    • Adultos: Têm músculos respiratórios mais maduros e fortes e maior capacidade residual funcional, permitindo uma resposta mais eficaz à hipercapnia.

Um ponto importante: então tendo revisado todos estes pontos podemos falar que devemos sempre ofertar mais oxigênio para a população pediátrica??? Não é bem assim…. e ainda podemos estar causando danos com esta estratégia!

Nem sempre mais oxigênio é melhor… Uma alta fração inspirada de oxigênio (acima de 50 a 60%) poderá resultar em toxicidade.

A toxicidade do oxigênio resulta da geração excessiva de espécies reativas de oxigênio, também conhecidas como radicais livres, quando os níveis de oxigênio são elevados. Estas formas reativas de oxigênio podem causar danos a células e tecidos por meio de processos como peroxidação lipídica, danos ao DNA e oxidação de proteínas.

Quanto devemos oferecer de oxigênio?

Qual deve ser o objetivo da SpO2?

Esta é uma ampla discussão! O que é importante lembrarmos é que não necessitamos ter uma SpO2 100% para garantir uma boa oxigenação. Cada vez mais, principalmente na população de risco aceita-se trabalhar com faixas de SpO2 entre 90 a 95% e assim minimizar os riscos da hiperóxia. E devemos lembrar que uma boa oxigenação não depende apenas da fração inspirada de oxigênio. Vamos precisar entender a causa da queda da saturação, para assim tentar otimizar lançando mão de outros recursos também.

Quais outros fatores podem influenciar a oxigenação? Um fator que muitas vezes não nos lembramos e tem influência direta é a pressão de via aérea (Paw). A pressão na via aérea tem influência direta sobre a abertura dos alvéolos e portanto influencia na área de troca gasosa pulmonar.

Outro fator que devemos nos atentar é na relação de tempo inspiratório: expiratório. A relação habitual é de 1:2, no entanto esta relação deve ter o tempo expiratório:

  • aumentado: ex.: 1:3 – para doenças obstrutivas ou qualquer situação que exista dificuldade expiratória (ex.: broncoespasmo)
  • reduzido: ex.: 1:1 – para situações como a síndrome do desconforto respiratório agudo (ARDS) ou outras situações com dificuldade ventilatória; este ajuste pode ajudar a aumentar a pressão média das vias aéreas, melhorar a recrutabilidade alveolar e, consequentemente, a oxigenação.

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