Diretrizes:
Prevenção de Consciência Intra-Operatória

A consciência intraoperatória durante a anestesia, é um fenômeno em que um paciente se torna consciente e tem uma lembrança explícita dos eventos durante a cirurgia enquanto está sob anestesia geral. É caracterizada pela lembrança espontânea de eventos intraoperatórios, podendo incluir percepções auditivas, táteis e até mesmo dor, embora esta última seja menos comum.

 

Incidência:

A incidência de consciência intraoperatória varia, mas geralmente é baixa, estimada em cerca de 0,1-0,2% na população geral.

O  Projeto de Auditoria Nacional (NAP-5), no Reino Unido, relatou uma incidência de cerca de 1 em 15.000 a 1 em 19.000. Isto representa provavelmente uma subestimativa significativa pois não foi realizada uma pesquisa ativa para detectar CIO.

A incidência é maior em algumas situações, como em cirurgia cardíaca, cirurgia de trauma, cesarianas e pacientes pediátricos.

Os pacientes muitas vezes não entendem a diferença entre sedação e anestesia geral, e podem relatar CIO prévia, mas que se devem ao fato de o paciente ter sido sedado e mal orientado.

 

Fatores de risco:

  • uso de  bloqueadores neuromusculares,
  • anestesia superficial,
  • características do paciente, como histórico de abuso de substâncias ou uso crônico de alguns medicamentos,
  • história de CIO prévia.

 

Fatores associados ao surgimento da CIO:

O fator contribuinte mais importante para CIO é a subdosagem de agentes hipnóticos. 

A subdosagem pode ocorrer pelas seguintes razões:

  • há um erro ou falha na entrega de anestesia
  • Necessidades de pacientes específicos são subestimadas
  • Falta de monitorização da profundidade anestésica

 

Técnica anestésica e risco:

A anestesia venosa total (TIVA) está associada a um maior risco de CIO em comparação com anestesia inalatória. 

Em contraste com a anestesia inalatória ou balanceada, em que a concentração de gases anestésicos exalados permite um ajuste em tempo real de dose, concentrações sanguíneas de agentes intravenosos não são facilmente obtidas durante a TIVA, o que pode levar a subdosagem.

Algumas medidas podem ser tomadas, buscando prevenir o surgimento da CIO.

  • Avaliação pré operatória para investigar uso de medicações (benzodiazepínicos e outros que possam induzir o citocromo p45)
  • Avaliar se há história de CIO prévia
  • Administração de doses suficientes de hipnóticos (idealmente monitorizando a profundidade anestésica)
  • Ter cuidado ao interpretar alterações de sinais fisiológicos como alterações de pressão arterial e frequência cardíaca – nem sempre elas refletem o despertar intraoperatório.
  • Monitoramento da concentração exalada (ou seja, a concentração alveolar mínima [CAM] dos agentes inalatórios
  • Uso de medicamentos adjuvantes nas situações ou para pacientes de maior risco (ex.: gestantes, trauma, ruivos, via aérea difícil)

Monitorização da concentração alveolar mínima

A CAM de um agente anestésico é a concentração exalada do agente anestésico em que 50 por cento dos pacientes não respondem com o movimento a um estímulo nocivo. A CAM para a supressão do movimento (mediada ao nível da medula espinal) é geralmente mais alta do que a CAM para a supressão da consciência ou a memória (isto é, CAM de despertar), proporcionando assim uma margem de segurança, assume-se uma analgesia adequada.

Diferentes agentes inalatórios podem ser comparados com suas determinadas CAMs. Como um exemplo, a CAM do isoflurano é de aproximadamente 1,2 por cento, enquanto a CAM de desflurano é de 6 por cento, o que indica que o isoflurano é mais potente do que o desflurano porque consegue o mesmo efeito com uma concentração inferior.

Enquanto uma concentração expirada inferior a 0,7 CAM tem sido proposto como um nível limiar de alarme apropriado, não é garantido que a hipnose e amnésia serão alcançadas em concentrações acima de 0,7 MAC. Outras limitações importantes da CAM como um monitor de profundidade anestésica incluem:

  • CAM refere-se às respostas do movimento, que são obscurecidas por bloqueadores neuromusculares.
  • CAM é variável entre os pacientes e é dependente da idade, farmacogenética, temperatura, e outros fatores.
  • CAM não é aplicável aos agentes intravenosos. Medicamentos vulgarmente utilizados, tais como o propofol tem conceitos análogos (ou seja, a concentração de plasma em que 50 por cento dos pacientes respondem [CP50]); no entanto, estas não são rotineiramente medidas no intra-operatório.

Monitorização da atividade cerebral

O monitoramento do cérebro (por exemplo, eletroencefalografia (EEG) não processada, EEG processada, potenciais evocados) fornece informações úteis durante a anestesia e pode melhorar a indução, manutenção e recuperação anestésica. EEGs não processadas contribuem muito para a monitorização da consciência intra operatória, mas são muito pouco práticas no intra-operatório.

EEG processado refere-se à tradução do sinal bruto EEG (delta, teta, alfa, beta, gama) a partir do domínio do tempo para o domínio de frequência através da Transformada de Fourier. A análise da contribuição de cada faixa de frequência resulta em um espectro de frequência. Uma variedade de características deste espectro é então analisada para avaliar a profundidade de anestesia. A técnica de estímulo-resposta dos potenciais evocados (geralmente potenciais evocados auditivos) também é utilizada para avaliar a profundidade da anestesia.

Uma série de dispositivos disponíveis no mercado têm sido estudados como potenciais monitores de profundidade de anestesia, incluindo BIS (BIS), potenciais evocados auditivos, entropia e monitores cerebrais do estado. Os alarmes de limite são definidos de acordo com as especificações do fabricante do dispositivo.

 

As sequelas da CIO são psicológicas. Muitos casos de CIO envolvem uma lembrança fugaz de eventos intra-operatórios e não causam ansiedade psicológica significativa ou stress. Outras experiências podem ser vivas e traumáticas. Essas experiências mais significativas aparecem mais provavelmente quando relaxantes musculares têm sido utilizados. O mais grave é o transtorno de estresse pós-traumático (TEPT) que pode surgir de maneira associada.

A incidência de sintomas psicológicos após um evento consciência varia entre 33 e 69%. Vale lembrar que estes dados são aproximados pela dificuldade de identificação e da pesquisa ativa destes casos. 

É importante entender que os riscos de consequências associadas a CIO existem e portanto, só reforça a necessidade de prevenção destes eventos.

 

(BIS ou SEDLINE ou CONOX)

A ASA (American Society of Anesthesiologists) e o Instituto Nacional de Saúde e Excelência Clínica (NICE), no Reino Unido em 2012 aconselham e consideramos nossas indicações de uso:

 

Avidan MS, Jacobsohn E, Glick D, et al. Prevention of Intraoperative Awareness in a High-Risk Surgical Population.The New England Journal of Medicine. 2011;365(7):591-600. doi:10.1056/NEJMoa1100403.

 

Myles PS, Leslie K, McNeil J, Forbes A, Chan MT. Bispectral Index Monitoring to Prevent Awareness During Anaesthesia: The B-Aware Randomised Controlled Trial. Lancet. 2004;363(9423):1757-63. doi:10.1016/S0140-6736(04)16300-9.

 

Chan MTV, Hedrick TL, Egan TD, et al. American Society for Enhanced Recovery and Perioperative Quality Initiative Joint Consensus Statement on the Role of Neuromonitoring in Perioperative Outcomes: Electroencephalography. Anesthesia and Analgesia. 2020;130(5):1278-1291. doi:10.1213/ANE.0000000000004502.

 

Stein EJ, Glick DB. Advances in Awareness Monitoring Technologies. Current Opinion in Anaesthesiology. 2016;29(6):711-716. doi:10.1097/ACO.0000000000000387.

 

Grosland JO, Todd MM, Goldstein PA. Neuromonitoring in the Ambulatory Anesthesia Setting: A Pro-Con Discussion. Current Opinion in Anaesthesiology. 2018;31(6):667-672. doi:10.1097/ACO.0000000000000654.

 

Avidan MS, Zhang L, Burnside BA, et al. Anesthesia Awareness and the Bispectral Index. The New England Journal of Medicine. 2008;358(11):1097-108. doi:10.1056/NEJMoa0707361.

 

Chan, M et al.  on behalf of the Perioperative Quality Initiative (POQI) 6 Workgroup. American Society for Enhanced Recovery and Perioperative Quality Initiative Joint Consensus Statement on the Role of Neuromonitoring in Perioperative Outcomes: Electroencephalography. Anesthesia & Analgesia 2020, 130(5):1278-1291. doi: 10.1213/ANE.0000000000004502

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